Sunday, December 26, 2004

A história do carrinheiro que pegou a pm pela frente e não pôde fazer nada mais do que chorar

Aí eu estava voltando do recreio para o trabalho, dia desses, quando a gente viu uns pms com um carrinheiro encostado na parede. Fui lá falar com eles.

Resumo da história: o camarada havia sido parado para averiguação pelos policiais. Ele era suspeito (sic) de ter assaltado uma senhora na praça Euphrásio Correia. Pelo que contaram os populares em redor, o carrinheiro tinha insistido em tentar ficar livre por aí, carrinhando, o que muito irritou os pms. Que, para evitar maiores constrangimentos e riscos, teriam dado uns corretivos no abdôme do carrinheiro. Coisa leve.

Aí checaram o carrinho do cara. Claro que não tinha nada. Liberaram o elemento carrinheiro.

O camarada carrinheiro, Fernando, chorava feito moleque que perdeu o poodle. Disse que tinham pegado na cirurgia dele. Mostrou o corte na barriga. Estava na fila do transplante do fígado, disse.

Em volta, todo mundo falando que o cara apanhou.

Com o crachá no peito, fui falar com os companheiros pms. Falaram da suspeita, admitiram uso de força para parar o elemento, negaram violência. Não fazem isso, disseram.

Voltei ao camarada carrinheiro. Falou que ia com a família à polícia. Fui com ele, enquanto outro repórter lá do jornal, o André, ligava para a PM para ouvir explicações. Íamos publicar a história.

Fui à delegacia, já com os companheiros familiares carrinheiros todos ao lado, vindos da Vila Torres, antiga Vila Pinto, ex-Capanema, atual Jardim Botânico.

Aí avisei para eles que ia de paisano. Ver o que os camaradas policiais respondiam sem saber que havia um jornalista por ali.

No centro, a polícia civil e a militar funcionam no mesmo prédio, a central de polícia, a quatro quadras do jornal, acho. Chegando lá, quem atendeu foi um pm. Quando ouviu a história, respondeu que o primeiro distrito, a parte civil da polícia ali, estava fechado. Delegacia fechada? Claro que não. Mas não dei bandeira.

O cara mandou nosotros ao QG da PM, na Marechal Floriano com a Getúlio Vargas. O Marechal de Ferro com um ditador. Positivo.

Chegamos lá e o soldado da guarita foi gente muito fina. Disse que esses soldados novos são mesmo despreparados e se erraram tinham mais é que ser denunciados. Mas tinha um truque. Era quarta-feira de tarde. E quarta-feira de tarde é tipo o domingo dos pms, na parte administrativa. Não tinha ninguém lá para registrar a queixa.

Tínhamos de voltar no outro dia, cedo. Mas aí, se houvesse chance de fazer uma perícia para constatar os socões no carrinheiro, já era.

Voltamos à central de polícia. O mesmo pm. Insisti, insisti, mais que piá quando quer ir jogar bola e a mãe não deixa. Ele chamou um investigador.

O investigador ouviu a história e deu o veredito.

- Olha, disse ele, não é que eu não queira registrar. Se você quiser, eu faço. Mas estou te dizendo uma coisa: esses caras são xarope. A cidade vai ficar pequena para você.

Insisti em saber mais.

- Eu sei que eles exageraram, mas releve que é melhor. Vai para a casa, tome um remedinho. Passe no posto de saúde. Estou tentando preservar a tua integridade física.

Insisti mais sobre o assunto. Ele respondeu que eu estava botando pilha no piá e que ele seria morto pelos pms se denunciasse. Fomos embora.

Fui para a redação. Escrevemos a história que podíamos comprovar. Foi publicada. Uma prova de que nem tudo está feio demais, acho.

Outra prova disso: no outro dia, ligaram para mim do Ministério Público do Trabalho. Era uma procuradora querendo processar os pms. E de uma ong, para dar um carrinho novo para o cara.

Encontrei o Fernando outro dia na rua. Ele não quis processar os pms. Ganhou o carrinho novo. E foi a grande atração de um desfile de carrinheiros.

E a vida continua.

Vi antes, vi antes

Vi o filme do Jorge Furtado antes que quase todo mundo. Abupitofió.

Fui no shopping e quando vi, ia passar Meu Tio Matou um Cara, em pré-estréia. Assim, sem eu saber. Vá ter sorte assim em Vanuatu.

O filme é bem joinha. Não vou contar muita coisa. Só uns poucos comentários metidos a esperto.

1 - Esse cara é tipos, muito legal.

2 - É o segundo filme do cara, dos três longas que ele fez, que tem um preto como ator principal. Cuiroso pra alguém que vem da terra da Gisele Bündchen.

3 - Sempre tem alguma mulher bonitona no filme dele. Agora é a Deborah Secco.

4 - Acho que esse camarada Jorge Furtado é o único cara que faz filmes bons no Brasil sobre gente de classe média que vive na cidade. Normalmente cinema brasileiro é sobre gente pobre. Ou é urbano, classe média e ruim, metido a besta.

5 - Curiosidade: fomos eu e a patroa comprar ingressos. Para o Jorge Furtado e para Os Incríveis. O fato de estarmos dois adultos querendo ver o filme da Pixar passou batido. Quando pedimos a enrada para Meu Tio Matou um Cara, a moça da bilheteria respondeu: É nacional. Um aviso de amiga, ela devia achar, claro.

6 - Quem puder, vá ver o filme.

Monday, December 20, 2004

Mobilização Urbana

Bom senso
Saiu na Folha de São Paulo de ontem que a equipe de transição do prefeito eleito da capital paulista, José Serra, não deve manter a construção de novos CEU´s (escolas de educação em tempo integral do governo Marta Suplicy). Entre os argumentos da equipe do novo prefeito está o fato de que os alunos dos CEU´s custam dez vezes mais que os da rede regular de ensino. Bem, veja bem. Não vou começar a defender aqui o projeto da Marta. Até porque não conheço e não sei seus prós e contras. Mas gostaria de desconstruir (aluno de mestrado não critica, desconstrói) essa noção de comparação de preços na educação.

Leia mais em: Mobilização Urbana - por Rosiane Correia de Freitas

O Lapão na Hiléia

DFW
Para os texanos, e ao menos para os guitarristas, a sigla acima quer dizer Dallas-Fort Worth, e se refere a uma área conurbada do estado que produziu Albert King e Stevie Ray Vaughan.David Foster Wallace, graças ao nome compridão para os padrões americanos e a um talento muito acima da média, está dando um jeito de colocar o acrônimo da cabeça de todo mundo.

Leia mais em: O Lapão na Hiléia - por Caetano Galindo

Sunday, December 19, 2004

Idéia tosca número 1

R$ 13,8 milhões. A prefeitura de Curitiba está anunciando um projeto para beneficiar as pessoas que moram na Terra Santa, uma das favelas mais ferradas da cidade. Custa R$ 13,8 milhões. A favela fica no Tatuquara, lá no sul de Curitiba, perto da Ceasa, perto do lixão. No Xapinhal, são 9 milhões para urbanização. O Xapinhal, no Sítio Cercado, também é bem feio.

Aí o esquisito é o seguinte. Esses valores foram doados, fácil, fácil, para as campanhas de candidatos a prefeito de Curitiba neste ano. Ora, as empresas que de maneira gentil cederam parte de seu capital na eleição não ganhariam mais fazendo uma obra que beneficia 4 mil pessoas na Terra Santa, por exemplo?

Não estou nem falando de ingenuidades, que esse dinheiro deveria ser melhor empregado. Que é claro que há interesses escusos nas doações. Mas será que as empresas não ganhariam mais fazendo algo por uma comunidade na cidade. Aumentariam o moral da empresa, já que é chique ser socialmente responsável. Ampliariam o número de gente que poderia comprar o produto deles. E ainda diminuiriam o tanto de gente que, por desespero, acaba roubando para comer.